Sem muitos exageros e hipérboles (que esse filme merece), gosto de como Coralie Fargeat pensa os corpos em seus filmes e as varias maneiras de linguagem corporal que ela consegue extrair do mesmo aqui elevado a máxima potencia. É como se os microcosmos que ela cria fossem tão criveis, que para as ferramentas narrativas realmente funcionarem ela dá vasão à fantasia e ao lúdico de maneira uniforme extrapolando a dialética para além da composição de imagens e saindo da logica estadunidense de pensar cinema como muitas vezes, um recorte morto de um universo parcialmente criado como muleta narrativa para manter o publico sempre engatilhado naquele universo, e não imerso.
Aqui a imersão e o design de produção, que evocam muito do cinema de David Lynch desde o filtro pasteurizado até em como as pessoas são completamente inúteis para a existência daquela realidade e tudo está em eterno status quo de uma vazia, mas bela cidade tratando tudo e a todos como meras ferramentas alimentando um fantasma invisível, mas muito presente, da indústria.
Demi Moore estar aqui no papel de Elizabeth Sparkle é sublime, e porque não poético. Uma musa de Hollywood que com o tempo entrou em desuso pela indústria, cada vez aparecendo menos em filmes. Senti durante todo o filme como se Moore usasse Sparkle para se divertir e falar através da arte e de onde ela pertence de como lhe fora tirada tudo aquilo e um quase aviso pra posteridade.
Em certos momentos, eu sinto que Fargeat usa o próprio filme como antítese e divide ele como dispositivos penetráveis em um jogo de sensações que vai afunilando cada vez mais e a cada vez que se vai usando a eloquência de maneira pragmática, o filme fica cada vez mais perto da nossa realidade, e em dada cena se há afirmações de que tal pessoa está linda, está do jeito que deveria estar, ‘perfeita’, e assim como na vida real esses padrões não são alcançáveis e só de existir um padrão para isso já é de se regurgitar, as consequências disso são tão humanas que fica até difícil de acreditar que aquilo é apenas ficção.
Comédia, Aflição e horror aqui andam de mãos dadas como pura frontalidade em um cinema desafiador para quem não está acostumado. Uma maneira linda de trazer esses debates como sendo estapafúrdios na visão e corpo de alguém que está alocada naquela realidade, fazendo com que todos os cenários sejam extremamente memoráveis e você sentisse o cheiro das coisas, as formas e cavidades. Filmadas das maneiras mais geniais possíveis, um POV errático nos jogando literalmente dentro das coisas.
Os vários dispositivos plantados durante a trama da maneira mais fluida possível e que conversam com todos os momentos do filme nos levam a ir numa queda vertiginosa na psique de uma estrela em declínio e como isso vai moldando sua realidade para consigo mesma. A Substância é visceral, bruta, cômico e fantástico.