A conta chegou no dia seguinte ao apagão que atingiu a Península Ibérica. Brasileiros residentes em Portugal acordaram nesta terça-feira calculando os prejuízos causados pela falha na distribuição de energia que durou mais de dez horas.
Dona do restaurante Casa da Grelhada Mista, em Sintra, arredores de Lisboa, a brasileira Isabel Cadete relata um prejuízo de € 2 mil (cerca de R$ 12.900,00 no câmbio atual) com a segunda-feira, somados os produtos, faturamento e a previsão do valor que gastará na reposição.
— Foi o estoque do dia. O prejuízo é que amanhã teremos que comprar tudo de novo, porque hoje é a nossa folga — disse ela.
Ela é uma das milhares de empresárias do setor prejudicadas em Portugal. A Associação Nacional de Restaurantes informou que o impacto nos restaurantes foi “muito grave pela perda de grandes quantidades de produtos perecíveis, como carnes, mariscos, peixes frescos e bacalhau congelado, que se deterioraram devido à falta de energia”. Além de terem uma quebra significativa no faturamento.
Segundo ela, as falhas no abastecimento de luz têm sido frequentes.
— Sabíamos que iria acontecer este apagão. Há três anos que a luz vai e volta. E, de janeiro até agora, o intervalo entre as falhas têm sido menores. Em um deles, meu freezer queimou. Estava previsto de estrear o novo ontem [segunda] — declarou.

Isabel contou que doou cerca de 20 quilos de carnes e 20 frangos que poderiam estragar:
— Picanha, tiras de porco, bife de novilho… Fomos doando. Como iríamos aproveitar? Pensei que ficaria sem luz também hoje.
Assim como Isabel, brasileiros iniciaram nas redes sociais e aplicativos de mensagens uma campanha de doação de alimentos, água e equipamentos, segundo o cônsul-geral em Lisboa, Alessandro Candeas.
— Contatamos representantes de nossa comunidade, não houve nenhum incidente. Ao contrário. Em nossa jurisdição, ofereceram nos grupos gás, água e alimentos para quem precisasse. A comunidade brasileira é muito solidária — disse ele, adiantando que os brasileiros que não puderam ser atendidos no consulado serão chamados em breve.
Com a possibilidade inicial de o apagão durar mais tempo, brasileiros e portugueses correram aos supermercados para abastecer a dispensa. A diarista Juliet Cristino tem dois filhos e diz que gastou, junto com o marido, cerca de € 1 mil (cerca de R$ 6.400,00) com as despesas feitas no cartão brasileiro e em euros, que começou a juntar há meses em um cofrinho.
— Comprei muita, mas muita comida. Foram mil euros em dinheiro e cartão só com comida e água. Na minha casa moram quatro pessoas e tenho crianças. Tinha que comprar muita coisa por causa delas. Fraldas e lenços umedecidos eu perdi a conta de quanto eu comprei — disse ela, que vive em Lisboa.
O prejuízo, segundo ela, foi maior porque a família, depois de ir aos supermercados e encontrar prateleiras vazias, teve que recorrer às lojas menores, que superfaturaram os preços, principalmente de garrafas d’água, pilhas e rádios.
— Aumentaram os preços, mas tínhamos que comprar. Um exemplo: produto que custava € 1 (R$ 6,4) estavam cobrando até € 5 (R$ 32).

Juliet conta que começou a se preparar para possíveis emergências desde o pequeno terremoto de 4,7 de magnitude em Lisboa, em fevereiro deste ano. Ela organizou uma mochila com remédios, equipamentos, como uma lamparina, começou a armazenar mantimentos e completou a dispensa na segunda-feira com outros produtos e água, porque o abastecimento público foi interrompido.
— Minha bolsa de guerra já estava pronta, eu estava preparada e vinha comprando enlatados. Já tinha um pouco há um tempo. Água tinha um pouco também. Faltou na minha rua. Tive que encher os galões. A água, nos mercados, foi o que acabou primeiro. Tem um filtro que toda pessoa devia ter, porque filtra qualquer água suja na hora. Fica limpinha — declarou.
Depois das horas de apreensão, Juliet diz que agora é tempo de trabalhar para amenizar o prejuízo.
— E ficar mais preparada. Vou deixar sempre o carro com bastante gasolina — disse ela, que foi abastecer o tanque do carro logo nesta segunda-feira de manhã, porque os postos fecharam mais tarde depois.

Os postos de gasolina tiveram procura elevada na manhã desta terça-feira, e havia filas de carros. O país ainda se recuperava do apagão e tentava voltar ao normal quando, logo cedo, encontrou dificuldades no metrô de Lisboa, que teve a circulação retomada totalmente por volta de 9h (5h do Brasil).
As redes foram totalmente estabelecidas em Portugal e na Espanha no começo da madrugada. Todas as subestações elétricas espanholas tinham energia às 5h.
Portugal tem 6,5 milhões clientes de distribuidoras de energia e 800 ainda esperavam que a energia fosse definitivamente religada pela manhã. As escolas receberam autorização do governo para funcionar normalmente.