É impossível falar de “A Semente da Figueira Sagrada” sem abordar o contexto de sua produção, seja político ou do próprio diretor e o quanto o Irã foi relutante no lançamento e distribuição desse longa, o que já o torna uma cápsula de história deixada para a posteridade tanto como forma de alerta em um possível futuro onde não haverá mais aquela realidade, seja para a reverberação mundial de um fato através da arte.
Mohammad Rasoulof aqui brinca com seu título e como trabalha as várias possibilidades através de suas lentes, com um suspense crescente dentro de uma realidade cruel e brutal resolvida e acompanha dentro de uma residência e os impactos dessa repressão política e religiosa afeta indiretamente tudo e a todos dentro de um país. A semente planta a intriga, é dela se planta a narrativa, partindo da ficção para escancarar a realidade.
O ficcional aqui se é usado a partir de uma família que sofre as cegas pelo patriarcado arcaico à imagem do pai da família interpretado por Missagh Zareh que está excelente e sabe ir desde uma pessoa singela que se sente culpado por julgar alguém sem ler o processo, até uma entidade maléfica moldada pelo sistema como um todo fazendo com que o ritmo do filme parece cada vez cadenciar ao passo em que a tensão vai tomando conta.
O seu maior dispositivo de suspense aqui se encontra em uma arma, sendo antítese da moralidade egoica do personagem que tanto quer o bem de sua família a partir de sua própria vitória e bem estar no trabalho sendo regido pela matriarca que tem a ilusória sensação de estar em controle de tudo e todos que moram ao seu redor.
Um descontrole emocional e pulsante vai tomando conta e transbordando a tela quando se vão tomando decisões amorais, que não que sejam muito contraditórias pela realidade retratada, mas sim dos personagens e como eles são construídos. É como se os personagens se moldassem ao fantasma invisível e individualista do sistema herdando sua brutalidade da maneira mais frontal possível sendo contraído a partir do trauma e medo.
Trauma e medo esses que são usados aqui quase como um flerte para com o cinema de gênero usando dos espaços a margem da moral, uma materialização na composição de cenas mostrando sutilmente a não existência de dualidades, a esquematização da sobrevivência em prol da humanização sóbria que vamos acompanhando durante toda a trama.
Os contextos e forma sequenciais de vídeos reais da internet como um grito de socorro, ditam e escancaram as realidades e qual papel do longa como arte, não gerando impacto, mas sim visibilidade, mas sim uma forma de dialogar com o restante do mundo algo que se perde nas penumbras da sociedade hegemônica que dita o que se deve ou não ser visto e o que tem ou não importância.
A Semente da Figueira Sagrada é um filme que perdura as margens do cinema como linguagem e entrega uma experiência arrebatadora que com certeza é um marco só de podermos assisti-lo.