A Polícia Civil de São Paulo instaurou em março um inquérito para investigar a plataforma Discord. A decisão ocorreu após investigadores terem solicitado que a rede social derrubasse uma live em um grupo fechado em que imagens de violência eram transmitidas para crianças e adolescentes. O pedido, no entanto, não foi atendido, informa a Secretaria de Segurança Pública.
O episódio foi flagrado por policiais do Núcleo de Observação e Análise Digital (Noad) enquanto os agentes investigavam um grupo conhecido por disseminar cenas de violência. Segundo a pasta, os líderes do grupo usavam as transmissões para compartilharem cenas de estupros virtuais e automutilação.
Na comunidade também foi registrada a venda de pornografia infantil. Segundo a delegada que coordena o Noad, Lisandrea Salvariego, o pedido para que a live fosse derrubada não foi tratado como emergencial pela plataforma.
— Nesse caso específico, os investigadores flagraram muita violência sendo transmitida ao vivo, por isso determinamos à plataforma o fim da transmissão e, mesmo assim, não fomos atendidos — disse Lisandrea.
Um documento sobre os casos foi encaminhado para o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), que instaurou o inquérito em 28 de março. Os policiais devem colher depoimentos dos representantes da empresa no país, além de outros envolvidos no episódio.
O Discord informou em nota que conduziu uma investigação sobre o caso e que conta com “equipes especializadas dedicadas a combater esse tipo de rede, identificando e removendo usuários e espaços em que pessoas mal-intencionadas estejam se organizando em torno de ideologias de ódio”.
A rede social diz possuir ferramentas automatizadas de bloqueio de envio de conteúdos que violem as diretrizes da comunidade. Também argumenta já investir em tecnologias para detectar casos de exploração infantil. A empresa informa ainda que mantém diálogo contínuo com órgãos como o Ministério da Justiça e está “comprometida em expandir a colaboração para outras autoridades, incluindo o Noad […] ódio e a violência não têm lugar em nossa plataforma”.
Emojis relacionados a conteúdos neonazistas
Como mostrou O GLOBO em março, o uso de emojis, siglas e códigos para mascarar diálogos extremistas entre jovens é presente no Discord. O tema ganhou destaque após ser retratado na série “Adolescence”, da Netflix. Os símbolos são usados com essa finalidade em comunidades da internet brasileira frequentadas por adolescentes.
O uso de símbolos relacionados a conteúdos neonazistas foi identificado nas chamadas “panelas” do Discord, rede de comunicação que se popularizou no Brasil durante a pandemia. São grupos restritos, para compartilhamento de conteúdo violento, onde surgem símbolos como o “copo de leite” e os “dois raios”, referências a movimentos supremacistas brancos e à SS, a organização paramilitar da Alemanha nazista.
Outra particularidade das “panelas” é a venda de pornografia infantil, identificada pelo emoji de um pirulito — ou lolly, em inglês, em referência ao romance Lolita, de Vladimir Nabokov. Por vezes, os usuários são adolescentes vendendo o próprio conteúdo erótico.
A plataforma informou ainda que realiza denúncias proativas de comunidades como as “panelas” e que essas ações já resultaram em prisões confirmadas e evitaram a concretização de crimes. “A equipe de Segurança também adota medidas adicionais com base em tendências observadas na plataforma ou em informações recebidas de fontes externas”, diz texto do Discord.