Deputada atingida por gás aciona STF após violência policial contra indígenas

A deputada Célia Xakriabá (PSOL-MG) anunciou, nesta sexta-feira, 11, que ingressou com uma representação criminal, no Supremo Tribunal Federal (STF), na qual denuncia a violência policial que sofreu, na noite de quinta-feira, 10, durante o final da marcha do Acampamento Terra Livre (ATL), em Brasília. A parlamentar e outros indígenas foram atingidos por gás de pimenta e bombas de efeito moral quando tentavam acessar o prédio do Congresso Nacional.

Ainda muito abalada com o incidente, a parlamentar disse que a denúncia tem como alvos o Governo do Distrito Federal e órgãos de segurança pública. Ela ressaltou que estavam todos em um movimento pacífico e que não caberia aquele tipo de reação violenta contra os indígenas, mas recebeu a informação da Polícia Legislativa da Câmara de que a medida atende aos protocolos, depois do que ocorreu em 8 de janeiro de 2023, quando os prédios foram atacados e vandalizados.

A deputada divulgou um vídeo em que aparece sofrendo com os olhos ardendo em dor e teve sua passagem impedida pelos policiais. Segundo ela, foi necessário chamar uma advogada para ela entrar no prédio da Câmara, onde recebeu atendimento médico e fez um Boletim de Ocorrência (BO), na Polícia Legislativa do Congresso. A maioria dos indígenas que passaram mal era de mulheres da etnia Xakriabá e receberam atendimento médico ainda na calçada.

“As pessoas não sabem, nós somos o último brasileiro [o indígena] a conseguir chegar no Congresso Nacional depois de muito tempo. Então, quando fala que estamos atrasados, não somos atrasados, atrasado é o parlamento brasileiro e também outros lugares que demoraram tanto tempo para ter a nossa presença”, declarou Xakriabá, que foi a primeira indígena a presidir a Comissão da Amazônia e Povos Originários Tradicionais e é, agora, a primeira originária na presidência da Comissão de Defesa da Mulher da Câmara.

A deputada se mostrou muito desapontada com o tratamento que recebeu. “Por algum momento, eu pensei que já tinha conseguido fazer com que essa Casa nos respeitasse. Por algum momento, eu pensei que era possível o nosso lugar aqui criar uma barreira de respeito aos povos, mas eu estava muito enganada. Porque não somente não serviu para proteger os povos indígenas num episódio como o de ontem, como não serviu também nem para me proteger. Como nós podemos proteger, quando nós não somos protegidos?”, questionou

A assessoria de imprensa da Câmara informou, em nota, que os indígenas romperam a linha de defesa da PMDF, derrubaram os gradis e invadiram o gramado do Congresso Nacional. “As Polícias Legislativas Federais da Câmara dos Deputados e do Senado Federal usaram agentes químicos para conter a invasão e impedir a entrada no Palácio do Congresso”, diz a nota.

O acordo, ressaltou a nota, era de que a marcha chegasse até a Avenida José Sarney, anterior à Avenida das Bandeiras, que fica próxima ao gramado do Congresso, mas parte dos indígenas resolveu avançar o limite.

Depois do Congresso, a parlamentar se dirigiu ao ALT, onde foi acolhida pelos indígenas presentes, como o povo Tupinambá, de quem recebeu proteções, e depois ela se recolheu com o povo Xakriabá, etnia da qual faz parte.

Apib considera ato deliberado

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), responsável pela realização do Acampamento Terra Livre (ATL), que desde a última segunda-feira, 7, reúne cerca de 7 mil indígenas em Brasília, repudiou a violência sofrida por seus parentes e considera que foi um ato deliberado das forças policiais.

O coordenador-executivo da Apib, Kleber Karipuna, classificou como truculenta a maneira como as polícias do DF e Legislativa do Congresso receberam os indígenas, que faziam uma marcha pacífica de encerramento do ATL, em defesa das demarcações de suas terras, em defesa da pauta climática e de seus direitos.

De acordo com o dirigente, todo os anos a entidade obedece a todas as exigências dos órgãos do Governo do Distrito Federal para a organização da marcha, que via como primordial a descida até a Praça dos Três Poderes, onde ficam, de um lado o prédio do STF e, de outro, o Palácio do Planalto, com o Congresso no meio. Mas na última quarta-feira, 9, a Apib foi chamada às pressas para uma reunião para comunicá-los de que não seria possível descer em passeata até o local.

Karipuna também refuta a informação de que a via estava totalmente bloqueada, quando a marcha chegou próximo ao Congresso, o que levou alguns indígenas a seguirem em frente, causando o incidente que feriu também a deputada.

O dirigente disse que um áudio captado na reunião deixou claro que a ação de violência contra os indígenas seria um ato deliberado, porque uma pessoa presente na reunião disse a seguinte frase: “Deixa logo descer, deixa descer, se fizer bagunça, mete a porrada”. Agora, a entidade indígena investiga de quem partiu a frase para tomar as medidas legais.

“Estamos tentando identificar quem proferiu uma frase dessa, de cunho primeiro preconceituoso, racista, que reforça o racismo institucional que tem no Estado brasileiro e, principalmente, nas Forças de Segurança do Estado. E ainda uma frase de incitação ao ódio contra os povos indígenas, contra o nosso acampamento, contra a nossa liderança, contra a nossa organização”, afirmou.

Os dirigentes da Apib prometem tomar medidas jurídicas e administrativas em relação à violência policial contra os indígenas. Conforme Karipuna, além da deputada Célia Xakriabá, dez pessoas passaram mal após inalar gás de pimenta e quatro tiveram que ser removidas para atendimento hospitalar, mas todos já foram liberados.

“Que esse fato não fique transparecendo que seja um fato de violência dos povos indígenas contra as instituições de Estado. Muito pelo contrário, diferentemente do que ocorreu em 8 de janeiro, muito diferente, zero de comparação. A nossa marcha não tem e nunca terá intenção nenhuma de atacar as instituições do Estado. O movimento indígena sempre foi e sempre será um movimento ordeiro, pacífico, mas muito aguerrido e lutador pelos seus direitos”, afirmou Karipuna.

ATL encerra suas atividades nesta sexta-feira, com o lançamento da carta final do evento e com programação cultural à noite. Durante o dia, vários grupos indígenas desmontaram seus acampamentos e começaram o retorno para seus territórios.

Entidades repudiam violência

O Conselho Indigenista Missionário (Cimi), ligado à Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), também emitiu nota de repúdio ao incidente contra um movimento pacífico realizado em Brasília.

“Lamentamos o uso desnecessário de substâncias químicas contra os manifestantes, mulheres, idosos, crianças e lideranças tradicionais. Temos evidências de que os atos fazem parte de um contexto de violência institucional disseminada contra os povos indígenas”, declarou o Cimi, numa referência ao áudio divulgado pela Apib.

A organização “Parlamentarians for a fóssil-free future” – Parlfossilfree – (Parlamentares por um futuro livre de fósseis, em tradução livre) também lançou uma nota de solidariedade à deputada Xakriabá, na qual considera uma agressão inaceitável aos líderes indígenas e comunidades – que estão na linha de frente defendendo a natureza, o clima e os direitos humanos – e que deve ser condenada. “Não pode haver justiça climática sem justiça indígena. Suas vozes, territórios e direitos devem ser respeitados – não enfrentados com violência”, pontuou.

Redação Update

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