Como é a vida no ‘Parque das Tribos’, maior conglomerado indígena não aldeado do Brasil

Em meio ao contexto urbano de Manaus, o Parque das Tribos resiste como um símbolo de preservação cultural. Localizada na Zona Oeste, a comunidade reúne cerca de 35 etnias que enfrentam os desafios de manter vivas as tradições indígenas. Mesmo em meio a agitação da cidade, costumes, ritos e idiomas são passados de geração em geração como forma de valorização da própria identidade.

Fundado em abril de 2014, o Parque das Tribos começou como uma ocupação organizada por diferentes indígenas, que hoje abriga 5 mil pessoas de 860 famílias, provenientes de diversas etnias da Amazônia e de outros estados do Brasil, como Roraima, Pará e Acre.

Um dos líderes do local, o cacique Ismael Munduruku, explicou que a comunidade não foi criada por uma única pessoa, mas sim por várias lideranças, que se mobilizaram para ocupar a área de 37 hectares.

“Nós temos outras comunidades indígenas dentro de Manaus, no entorno também, mas nós queríamos uma maior, uma que pudesse realmente se tornar um bairro, se tornar uma referência, onde a gente pudesse construir projetos, constituir família, criar raízes”, enfatizou Ismael Munduruku.

A diversidade étnica é uma das principais caracterísitcas do Parque das Tribos. Entre as etnias que vivem na comunidade há os Munduruku, Sateré-Mawé, Tikuna, Tucano, Baniwa, Tarianos, Dessanos, Curripaco, Wanano, Mura, Cambeba e Marubo.

Para os moradores, a preservação da cultura é um modo de vida. “Nós praticamos a nossa cultura aqui da mesma foram que fazíamos no interior, de onde viemos”, disse o cacique Ismael Munduruku.

Cacique Ismael Munduruku. — Foto: Acervo pessoal
1 de 4 Cacique Ismael Munduruku. — Foto: Acervo pessoal

Uma das bases dessa preservação é o ensino dos dialetos nativos. Cada povo mantém o idioma dos ancestrais, que são repassados para as novas gerações. Eliza Sateré, também liderança local, explica que esses ensinamentos acontecem no cotidiano familiar.

“Quando vamos pedir algo, como comida ou água, falamos na nossa língua. Em público, também usamos o nosso idioma para nos comunicarmos com nossos filhos de uma forma que os outros não saibam”, conta.

A culinária tradicional é outro elemento que ajuda na preservação cultural no Parque das Tribos. Pratos típicos, como a quinhapira, apelidada de “comida dos deuses”, são parte essencial das refeições.

“Eu gosto de comer quinhapira, que é como se fosse uma caldeirada. O acompanhamento é beiju [tipo de tapioca], que eu faço, e bastante pimenta”, enfatizou Helena do Carmem, da etnia Tariano.

Alguns disseram que preferem saborear o prato típico com a crocância da formiga saúva. A coleta dos insetos, conhecidas também como “tanajura”, é uma prática que se intensifica a partir de setembro.

Os moradores contaram que vasculham os formigueiros e assim que conseguem capturar o inseto os colocam em garrafas PET. Eles explicam que a formiga é rica em gordura natural e, misturada com farinha, a iguaria já pode ser saboreada.

Além da gastronomia, as tradições culturais são expressas em celebrações como a “Dança dos Mascarados” e as festas de santos, que unem a comunidade em momentos de devoção e alegria.

“Cada evento que a gente faz dentro da comunidade, a gente procura reunir as lideranças, procura reunir a maior quantidade de ‘parentes’ que moram aqui, porque a cultura é bem diversificada. É uma mais linda que a outra. Então é um aprendendo com o outro e sempre um respeitando a cultura do outro. E essa convivência, essa união com eles nos fortalece cada vez mais”, afirmou Eliza Sateré.

A Maloca, construída em meio a comunidade, desempenha um papel central na preservação das tradições e funciona como um coração que pulsa a cultura dos povos nativos. Ismael Munduruku conta que é no espaço que ocorre os principais eventos sociais, políticos e religiosos do Parque das Tribos.

Lá, os diferentes povos indígenas, que vivem na comunidade, celebram as datas comemorativas, como o Dia dos Povos Indígenas, em 19 de abril, e o Dia Internacional dos Povos Indígenas, em 9 de agosto.

Desafios

Apesar da comunidade ter acesso a água encanada e ter um uma Unidade Básica de Saúde (UBS) para atendimento da população local e bairros adjacentes, o Parque das Tribos ainda enfrenta desafios na infraestutura, como educação, transporte e saneamento.

Na educação, Ismael Munduruku destaca a falta de uma escola que oferte o ensino médio. Outro desafio é a oferta escassa de linhas de transporte público que circulem pela região.

Ismael diz ainda que toda comunidade deseja oportunidades iguais para seus moradores e sonha com um local que, além de ser um símbolo da cultura indígena, também seja reconhecido como um lugar de conhecimento e desenvolvimento.

“Nós não queremos nenhum privilégio, só queremos ser medidos da mesma forma que o restante do nosso país. Queremos ter as mesmas oportunidades e queremos dar às pessoas daqui essa mesma oportunidade”, finalizou.

Redação Update

Related Posts

  • All Post
  • Amazonas
  • Brasil e Mundo
  • Ciência e Tecnologia
  • Cinema
  • Críticas
  • Destaques
  • Entretenimento
  • Esportes
  • Games
  • Parintins
  • Política
  • Popular
  • Saúde
  • Séries e TV
  • Sociedade

Qual sua opinião sobre isso ?

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Edit Template

© 2024 Created with Royal Elementor Addons

plugins premium WordPress

Find Your Way!

Categories

Tags